São Paulo teve jacaré com carapaça de tatu

Paleontólogos descobrem um bizarro jacaré extinto com presas de queixada e uma armadura que lembra a dos tatus

Peter Moon


Presas como as das queixadas e caparaça parecida com a de um tatu

Entre 90 e 80 milhões de anos atrás, o interior do Brasil era o lar dos jacarés mais esquisitos que existiram, os esfagessauros. Eles eram jacarés terrestres e tinham patas longas como as de um lobo. Em 2008, descobriu-se uma espécie com dentes próprios de um herbívoro. Ao contrário de qualquer crocodiliano vivo ou extinto, todos carnívoros, o Sphagesaurus montealtensis era um jacaré que pastava (confira em O jacaré que pastava). Agora, achou-se outra espécie ainda mais estranha.

O mais novo esfagessauro brasileiro era protegido por uma intrincada armadura formada por placas ósseas fixas e móveis, assim como acontece com a carapaça dos tatus atuais. É o que afirmam os seus descobridores, os paleontólogos Thiago Marinho e Ismar de Souza Carvalho, da Universidade Federal do Rio de Janeiro. O Armadillosuchus arrudai (ou crocodilo-tatu) foi encontrado na região de General Salgado, noroeste do Estado de São Paulo. Seus fósseis são compostos por um crânio quase completo, uma pata, e uma complexa e surpreendente armadura. 

O escudo de placas ósseas do armadilhossuco começa na base do crânio, onde as placas têm formato hexagonal e são fixas, formando um tipo de capacete ósseo. É só depois do pescoço que as placas, agora retangulares, tornam-se móveis, como na carapaça dos tatus. Uma outra característica do armadilhossuco são as suas longas presas posteriores. Elas são saltadas para fora, assim como acontece com as queixadas. Segundo Marinho e Carvalho, estas presas podiam ter a função de escavar o solo para coletar alimentos. Tudo indica que o animal era onívoro, ou seja, tinha uma dieta variada. “É plausível que esses animais poderiam se alimentar de moluscos, insetos ou mesmo raízes, pinhas e plantas”, afirma no estudo, publicado no Journal of South American Earth Sciences


A reconstrução do esqueleto da armadillossuco, e de sua aparência viva

Há 90 milhões de anos, no período Cretáceo, o interior paulista era uma caatinga semi-árida. O estudo das rochas onde estava armadilhossuco sugere que havia na região um lago, onde o bicho se alimentava. Procurados pelo repórter, os autores não se pronunciaram. Eles afirmaram que só o farão na apresentação de uma reconstrução do antigo jacaré. A apresentação da reconstrução do armadilhossuco quando vivo está prevista para depois do carnaval. 

A descoberta do armadilhossuco ocorre três meses após o anúncio de um outro jacaré extinto do grupo dos esfagessauros. O esfagessauro viveu no interior de São Paulo, há 90 milhões de anos. “Ele é o jacaré mais esquisito que eu já vi”, disse o autor da descoberta, o paleontólogo Marco Brandalise de Andrade. “Ao contrário de qualquer crocodiliano vivo ou extinto, aquele bicho provavelmente era herbívoro”. Com suas características bizarras, os esfagessauros formam um grupo de jacarés terrestres ainda muito pouco conhecido. O fóssil do armadilhossuco é o mais completo já encontrado. 

Os esfagessauros pertenciam a um grupo maior, o dos notossúquios, ou “crocodilos austrais”. Os notosuchus surgiram no antigo supercontinente de Gondwana, que começou a se dividir há mais de 160 milhões de anos para dar origem a América do Sul, África, Austrália, Antártica e Índia. Na América do Sul, eles viveram da Patagônia ao Nordeste brasileiro. Além de São Paulo e Minas Gerais, seus fósseis foram encontrados em Mato Grosso, no Maranhão e no Ceará. Exemplos são os “paulistas” adamantinassuco, baurussuco e mariliasauco, o “mineiro” uberabassuco e o “cearense” araripessuco.

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