Campinas-Jundiaí é a 6a maior cidade brasileira. O Cairo, no Egito, é a maior mundo


A cidade de Campinas (SP), a sexta maior do Brasil. Hoje, deve passar dos 3 milhões de habitantes

Pesquisadores do Ceará constróem algoritmo para descobrir quais são as maiores cidades do mundo. O resultado surpreenderam. Nem Tóquio nem Xangai. A maior metrópole fica no Egito, com 63 milhões de habitantes. No Brasil, a metrópole sediada em Campinas-Jundiaí já é maior do que Salvador, Brasília, Curitiba e Goiânia






Qual é a maior cidade do mundo? Quem pensou em Tóquio ou Xangai, errou. Segundo os resultados de um novo algoritmo desenvolvido por pesquisadores brasileiros e um argentino, a maior cidade do mundo é a conurbação que une as cidades de Alexandria, Cairo e Luxor, no Egito, com 63,5 milhões de habitantes. Em segundo lugar vem Daca, a capital de Bangladesh (48,4 milhões), e em terceiro a conurbação Cantão-Macau-Hong Kong, na China, com 44,4 milhões de habitantes.

O emprego do mesmo algoritmo para quantificar as maiores cidades do Brasil revela algumas surpresas. É o caso de Campinas (SP). Do ponto de vista de população absoluta, seus 1,18 milhão de habitantes a colocam no 14o lugar entre as maiores cidades brasileiras. Já segundo o novo algoritmo, que analisa a conurbação dos municípios da região metropolitana de Campinas e dos municípios da microrregião de Jundiaí, a metrópole Campinas-Jundiaí era, em 2000 (a data dos dados censitários usados neste trabalho), a 6a maior metrópole brasileira, com 2.638.862 milhões de habitantes, à frente de Salvador, Brasília, Curitiba e Goiânia.

Do ponto de vista demográfico, a definição legal de cidade adotada pelo Brasil é aquela do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), segundo a qual cidade é o distrito sede do município. Na época em que vivemos, quando a expansão demográfica e o crescimento explosivo das cidades fazem com que, pela primeira vez na história da humanidade, metade da população mundial passe a viver em centros urbanos, a definição usada pelo IBGE parece por demais simplista, convenhamos.

"As pessoas ainda não sabem definir muito bem o que é uma cidade. Existe uma grande problemática a este respeito. Uma das formas para definir cidades é pensar em agrupamentos de pessoas. Mas o agrupamento pode eventualmente ser maior do que os limites administrativos da cidade," diz o físico Erneson Alves de Oliveira, professor do Laboratório de Engenharia do Conhecimento, da Universidade de Fortaleza (Unifor), no Ceará. "Uma forma clara para visualizar isto são as imagens noturnas dos continentes feitas por satélites. Os grandes aglomerados de cidades são aquelas manchas de luz que vão se espraiando sobre o fundo negro, a partir de uma grande metrópole, e que vão se conectando a outros centros urbanos."

Segundo Oliveira, uma visão moderna das cidades estabelece que elas podem ser definidas pelas interações entre vários tipos de redes, desde redes de infra-estrutura até redes sociais. "Nos últimos anos, um número crescente de estudos tem sido proposto para definir cidades por meio de modelos matemáticos consistentes, para investigar indicadores urbanos em escalas inter e intra-cidades, a fim de lançar alguma luz sobre os problemas enfrentados pelos tomadores de decisão."

Foi exatamente isto o que fizeram Oliveira e o Prof. Vasco Furtado, da Unifor, ao lado do Prof. José Soares de Andrade Júnior, do Departamento de Física da Universidade Federal do Ceará, e do Prof. Hernán Alejandro Makse, da Universidade da Cidade de Nova Iorque. Eles criaram um novo algoritmo para quantificar cidades que leva em conta tanto dados demográficos e de infra-estrutura, como dados sociais e culturais específicos da região, do país e do continente onde se encontram as metrópoles analisadas. O trabalho "Um modelo mundial para limites de assentamentos urbanos" foi publicado na revista científica britânica Royal Society Open Science (http://rsos.royalsocietypublishing.org/content/5/5/180468).

"O que nós propomos é um modelo mundial para definir assentamentos urbanos além de suas fronteiras administrativas," diz Oliveira. "Isto é feito por meio de uma abordagem que leva em conta as tendências culturais, políticas e geográficas naturalmente associadas à maioria das sociedades ao redor do mundo. Tais dados refletem diretamente nas dinâmicas regionais de crescimento e, por conseguinte, na distribuição da população nos diversos continentes."

Como exemplo de tais relações, considere uma cidade com população de tamanho X que consome uma quantidade de água Y. Se a população dobrar (2X), o consumo de água também irá dobrar (2Y). Consumo de água é um indicador urbano que observa uma relação de proporcionalidade (isométrica) com o aumento populacional.

Há, porém, indicadores urbanos que observam relações desproporcionais (ditas relações alométricas). Como por exemplo o número de postos de gasolina. Ora, uma cidade de população X tem Y postos de gasolina. Está claro que, se a população dobrar (2X), o número de postos não precisará dobrar para acompanhar o aumento da demanda por combustível. A quantidade de postos necessária para suprir a cidade 2X é um número menor que 2Y. Aqui, o que entra em jogo é a chamada “economia de escala”.

O novo algoritmo para estimar o tamanho de cidades criado por Oliveira e colegas visa fornecer um resultado mais preciso do tamanho de uma cidade para a correta inferência dos indicadores urbanos.

De acordo com Oliveira, existem mecanismos hierárquicos por trás do crescimento e inovação de assentamentos urbanos. Estes mecanismos são regidos por uma combinação de medidas gerais, tais como a população e a área de cada cidade, e fatores intrínsecos que são específicos para cada região, como a heterogeneidade topográfica, questões políticas e econômicas, e costumes e tradições culturais. "Em outras palavras, se uma turbulência política ou recessão econômica aflige uma metrópole por um longo período, todos os seus satélites são afetados, ou seja, toda a região regida pela metrópole será impactada negativamente."

O administrador público precisa destas informações para decidir como melhor alocar os recursos de que dispõe para investir em infra-estrutura, educação, transportes, segurança e saúde. Todas estas políticas públicas são baseadas em alguns indicadores urbanos, que obviamente podem mudar bastante quando se leva em conta apenas uma cidade, ou uma região metropolitana, ou uma conurbação ainda maior.


O físico Erneson Alves de Oliveira, da Unifor, autor do trabalho que recalcula o tamanho das grandes cidades (divulgação Unifor)

Afinal, o que é uma cidade?
Definir o que é uma cidade não é tarefa fácil. Se o critério utilizado for o total de habitantes que vivem numa região metropolitana, então a maior metrópole do mundo é Tóquio, com 37,9 milhões de habitantes, seguida por Jacarta, na Indonésia, com 31,9 milhões, e o Cairo no Egito em 3o (27,3 milhões). Sob este critério, São Paulo é a 10a colocada, com 20,8 milhões, e entre as dez maiores cidades há duas chinesas (Xangai e Pequim), duas indianas (Deli e Mumbai), além da Cidade do México e de Seul, a capital da Coreia do Sul. 

Mas há outras formas de quantificar cidades. Quando se leva em conta os dados individuais de cada município, a maior cidade do mundo é Xangai, com 17,8 milhões de habitantes. Neste critério São Paulo sobe três colocações e ocupa o 7o lugar, com 12,1 milhões, enquanto Tóquio cai para 16o, com 9,07 milhões.

Em vez de usar um critério absoluto como o número de habitantes, pode-se definir cidades através de critérios relativos, como por exemplo a densidade populacional, número de pessoas por quilômetro quadrado (km2). Assim, a maior cidade do mundo passa a ser Daca, a capital de Bangladesh, com 16 milhões de habitantes e densidade populacional de 45,7 mil pessoas por km2, e a segunda maior cidade é Mogadishu, na Somália, que tem 2,45 milhões de habitantes, porém densidade populacional de 26,8 mil pessoas por km2. Sob este critério, as outras oito colocadas entre as dez maiores cidades do mundo ficam na China (Hong Kong e Macau), Índia (Mumbai, Surat e Vijayawada), Paquistão (Hyderabad e Karachi), além de Raca, na Síria.

O tamanho de uma cidade pode ainda ser definido de acordo com a sua área urbana. Neste caso, a maior metrópole do mundo seria Nova Iorque, cuja população de 21,5 milhões de habitantes ocupa uma área de 11,8 mil km2, o que é 7,6 vezes maior do que a área urbana da Cidade de São Paulo.

São tantos os critérios possíveis para definir cidades, que os autores deste trabalho se propuseram um desafio ousado: construir um modelo matemático que fosse suficientemente poderoso para definir as maiores cidades do planeta. 

"O nosso modelo se chama “algoritmo de aglomeração local de cidades” (ou CLCA, em inglês). Ele foi construído a partir de um modelo pré-existente, o “algoritmo de aglomeração de cidades” (CCA), que também define cidades além de suas fronteiras administrativas para casos não-continentais, usando a noção de contiguidade espacial dos assentamentos urbanos e do nível de comutação eles", diz Oliveira. "Assim, o CCA é definido para paisagens discretas ou contínuas de população através de dois parâmetros: um limiar de densidade populacional e um limiar de distância. Esses parâmetros descrevem as áreas povoadas e que possuem relações socioeconômicas, respectivamente."

O estudo do grupo de pesquisadores sul-americanos usou dados do Centro de Aplicações e Dados Socioeconômicos da Universidade de Columbia, para aplicar o algoritmo CLCA a um único conjunto global de dados de população. Tal conjunto é uma compilação de imagens de satélite e dados em grades censitárias a fim de disponibilizar as populações das áreas urbanas e rurais de 232 países no ano de 2000.

Vista do Cairo, a maior metrópole do planeta, com 63,5 milhões de habitantes

Cairo-Alexandria-Luxor
"De acordo com nossos resultados, as maiores cidades do mundo não estão alinhadas com a lista das maiores cidades segundo as Nações Unidas," diz Oliveira. "Descobrimos, por exemplo, que a maior cidade do mundo é uma aglomeração de vários pequenos vilarejos próximos uns dos outros, ligando três grandes aglomeramentos egípcios: Alexandria, Cairo e Luxor. 

Alexandria e o Cairo são cidades vizinhas. É interessante notar que Luxor, igualmente localizada às margens do rio Nilo como o Cairo, se encontra a 650 quilômetros de distância das outras duas cidades. Ou seja, segundo o algoritmo criado pelos pesquisadores os 650 quilômetros de margens do Nilo que ligam Luxor ao Cairo formam um único mega-aglomerado urbano.

"É bem sabido que quase toda a população do Egito vive em uma faixa ao longo do Nilo, no delta do Nilo e no canal de Suez, o que em conjunto corresponde a 4% da área total do Egito - justamente onde há terras aráveis para produzir comida," explica Oliveira. 
"As margens do Nilo e de seu delta são compostas por algumas grandes cidades e muitas pequenas vilas, aldeias e assentamentos, o que torna a região extremamente densa do ponto de vista populacional. Assim, nossos resultados levantam a hipótese de que estas cidades e aldeias ao longo do Nilo podem ser vistas como uma espécie de 'megacidade'. Apesar de espacialmente não contígua, a megacidade Cairo-Alexandria-Luxor está unida por laços abstratos devido às relações socioeconômicas, que se refletem em elevados níveis de deslocamento (comutação) entre as suas sub-regiões.


A conurbação de Jundiaí (SP) (foto) com Campinas resulta na sexta maior cidade do Brasil

Campinas-Jundiaí
No caso brasileiro, chama a atenção a classificação que recebe a conurbação urbana que é centrada ao redor da cidade de Campinas. Aqui se aplica o conceito de comutação urbana. Centenas de milhares de pessoas que trabalham em Campinas moram nas cidades do seu entorno, como Americana, Hortolândia, Indaiatuba, Itatiba, Paulínia, Santa Bárbara d'Oeste, Sumaré e Valinhos - todas cidades com mais de 100 mil habitantes cada. 

Da mesma forma, a comutação urbana e as relações econômicas unem os 20 municípios da Região Metropolitana de Campinas com os cinco municípios da microrregião de Jundiaí (Jundiaí, Várzea Paulista, Campo Limpo Paulista, Itupeva e Louveira).

Desta forma, a nova metrópole Campinas-Jundiaí possuía 2,64 milhões de habitantes (em 2000), mais do dobro dos 1,2 milhão de campineiros segundo estimativa do IBGE de 2017.

Os pesquisadores acreditam que seu algoritmo pode ser aplicado em todo o mundo, sem quaisquer restrições regionais. "Nossa definição de cidades abre as portas para o estudo da economia das cidades de maneira sistemática, independentemente de definições arbitrárias que empregam fronteiras administrativas."

Como os dados utilizados no estudo são do ano 2000, é possível que, ao se repetir os cálculos com dados mundiais de 2010, a região de Campinas comece a se conectar à região metropolitana de São Paulo, e às regiões de São José dos Campos e da Baixada Santista, para vir a formar um aglomerado ainda maior, que venha a beirar os 30 milhões de habitantes, uma conurbação com o nome de Campinas-São Paulo-Santos.


CONTATO DOS AUTORES:
Prof. Dr. Erneson Alves de Oliveira
Laboratório de Engenharia do Conhecimento
Universidade de Fortaleza (Unifor)
Fortaleza-CE
Telefone: (85) 3477-3079
Celular: (85) 98118-0407
e-mail: erneson@fisica.ufc.br

assessoria de comunicação da Unifor

Luiz Carlos de Carvalho
Trabalho: (85) 3477-3840
Celular e whatsapp: (85) 99820-7654


REFERÊNCIAS CIENTÍFICAS:
Oliveira EA, Furtado V, Andrade JS, Makse HA. 2018 A worldwide model for boundaries of urban settlements. R. Soc. open sci. 5: 180468. http://dx.doi.org/10.1098/rsos.180468


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