Cinco bilhões de anos de solidão

As cinco idades do universo - Parte 7


PETER MOON

“O universo é um lugar muito, muito grande”, afirmou a astrônoma Ellie Arroway no final do romance Contato (1985), de Carl Sagan. “Se só existisse vida aqui na Terra, então o universo seria um enorme desperdício de espaço.” A estimativa da abundância de vida extra-terrestre em nossa galáxia foi calculada pela primeira vez há 50 anos, quando o astrônomo americano Frank Drake formulou a hoje célebre Equação de Drake. De acordo com os cálculos originais, as 100 bilhões de estrelas da Via Láctea formariam um redemoinho fervilhante de vida.

Nos 13,2 bilhões de anos decorridos desde a formação da Via Láctea, a frieza probabilística da Equação de Drake estimou que nossa galáxia teria abrigado dezenas de bilhões de planetas com vida - e talvez um bilhão de civilizações inteligentes. Ao se aplicar a equação às bilhões de galáxias do universo visível, este abrigaria muito mais civilizações inteligentes do que o total de células do corpo humano

Somos poeira de estrelas”, dizia o astrônomo Carl Sagan. Os elementos constituintes da vida germinaram no útero de estrelas há muito desaparecidas. A evolução da vida, para Sagan, seria uma consequência estatística inevitável da complexidade e da antiguidade do cosmo. Qual seria o sentido deste “enorme desperdício de espaço” caso não houvesse ninguém para poder contemplar sua beleza e desvendar seus mistérios?
Os alienígenas com certeza existem, mas os humanos deveriam evitar fazer contato com eles, alertou em 2010 o físico inglês Stephen Hawking. “Se os alienígenas nos visitassem, as consequências seriam semelhantes às (que aconteceram) quando Colombo desembarcou na América, algo que não acabou bem para os nativos. Precisamos apenas olhar para nós mesmos para ver como a vida inteligente pode evoluir para alguma coisa que não gostaríamos de encontrar.

A “inevitabilidadede encontrar ETs levou o Escritório de Relações do Espaço Exterior das Nações Unidas (Unoosa), em Viena, a criar um protocolo diplomático para quando a humanidade fizer contatos de terceiro grau com civilizações extraterrestres (leia em Zarmina, uma segunda terra?).

Se dependesse apenas e tão somente da precisão estatística aplicada à vastidão cosmológica, da imaginação de cientistas como Drake, Sagan ou Hawking, da ansiedade dos fãs da ficção-científica, dos sonhos delirantes de ufólogos ou dos burocratas da ONU, a Humanidade já teria estabelecido há muito contatos dos mais variados graus com os ETs

Os alienígenas insistem em nos ignorar...

O grande sonho

Em 1960, Frank Drake foi trabalhar no Observatório Green Bank, em Virgínia Ocidental. Passou meses vasculhando o céu, sintonizando o seu rádio-telescópio para amplificar sinais de rádio provenientes do espaço profundo e que pudessem ter sido emitidas por vida inteligente. Drake não fazia ideia que o seu trabalho seria a semente do projeto Busca de Inteligência Extraterrestre (SETI). Nesse meio tempo, Drake começou a imaginar uma fórmula para calcular o número de civilizações inteligentes que existiriam na Via Láctea e pudessem ser detectadas. “Era algo que estava na minha mente por meses. A equação não surgiu como um ‘Ah-hã’. Para mim, era algo óbvio”, confessou Drake em entrevista à revista Science News.

Em 1º de novembro de 1961, Drake proferiu uma conferência em Green Bank para a qual convidou “todos os cientistas do mundo que poderiam ter algum interesse científico em inteligência extraterrestre – todos os 12”. Entre eles estava Sagan. Na conferência, Drake apresentou a sua fórmula.

N = R* x fp x ne x fl x fi x fc x L

A equação busca estimar “N”, o número de civilizações inteligentes que são contemporâneas da Humanidade e habitam planetas próximos o suficiente da Terra para fazermos contato.

R* é a taxa de formação de estrelas ao longo da história da Via Láctea
fp é a fração das estrelas que têm planetas
ne é o número de planetas com potencial para a evolução da vida
fl é a fração dos planetas onde a vida de fato evoluiu
fi é a fração dos planetas com vida inteligente
fc é a fração dos planetas onde a vida inteligente quer e têm meios para nos contactar
L é o tempo esperado de existência de tal civilização

A grande frustração

Em 1961, o resultado do cálculo foi de irrisórias 2,31 civilizações inteligentes e contemporâneas da nossa, com desejo e os meios para fazer contato. Parecia pouco. E era. O resultado atual é muuuito maior. A disparidade é explicada pelo avanço do conhecimento.

Em 1961, não se sabia se a maioria das estrelas tinha sistemas planetários, pois ainda não havia sido detectado nenhum planeta em órbita de outra estrela (o primeiro foi achado em 1993. Até o momento, eles somam 687). Também era desconhecida a média de estrelas que nasceriam por ano na Via Láctea (hoje, sabe-se, são em média 10), nem o total de estrelas da galáxia - um número que prossegue controverso, oscilando entre um mínimo de 100 bilhões e um teto de 600 bilhões de estrelas.

Hoje sabemos que a existência de planetas em órbita de estrelas é a regra, não a exceção. Também sabemos que as estrelas têm sistemas com vários planetas. Logo, há chance de existir pelo menos um planeta em cada sistema solar com condições de abrigar algum tipo de vida.

A nova esperança

Levando-se em conta todas estas correções, o resultado atual da Equação de Drake se aproxima das 20 mil civilizações na Via Láctea com vontade e condições de nos conhecer. Se há tantas civilizações, então por que meio século após o início do Projeto SETI ainda não detectamos nenhum sinal delas?

O problema é a distância. A Via Láctea é colossal, um disco achatado com 100 mil anos-luz de diâmetro. Se aquelas 20 mil civilizações estão distribuídas de forma uniforme pela galáxia, a mais próxima está a 350 anos-luz da Terra.

Se este é o caso, as antenas do SETI poderiam estar neste momento captando os sinais de uma civilização mais avançada tecnologicamente do que a nossa. Se este é o caso, as transmissões de rádio e tevê de tal civilização, viajando à velocidade da luz (300 mil km/s), teriam sido emitidas em 1666, quando uma maçã teria caído na cabeça de Isaac Newton, fazendo com que ele intuísse a gravitação universal.

Do mesmo modo, a primeira transmissão internacional de tevê, a da abertura dos Jogos Olímpicos de Berlim, em 1936, só será captada pelas antenas de rádio de nossa vizinha mais próxima no ano 2.300.

A Via Láctea fervilha de vida. O galáxia é vasta. Não será fácil fazer contato. 

continua em: O universo não precisa de Deus

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