Peter Moon
Por vezes, os editores de livros alteram os títulos originais de seus lançamentos à procura de termos mais apelativos. É o caso de O vinho mais caro da história (Jorge Zahar, 280 páginas, R$ 39,90, tradução de Maria Luiza Borges), do jornalista americano Benjamin Wallace. O título original é melhor. O vinagre do bilionário – o mistério da garrafa de vinho mais cara do mundo é um livro-reportagem dos bons. A tal garrafa é um Lafitte de 1787. Ela foi arrematada, em 1985, em um leilão na Christie’s de Londres, pelos donos da revista Forbes, por US$ 156 mil.
O valor exorbitante se deve a uma conjugação de fatores. O Château Lafite (que hoje se escreve com um só tê) Rothschild é uma das glórias de Bordeaux, a mais célebre região vinífera da França. Seus companheiros dessa categoria de vinhos tintos sem rival, os premiers crus, são os Haut-Brion, Latour, Margot e Mouton-Rothschild. A eles se somam apenas outros dois tintos, o Pétrus, também de Bordeaux, e o Romanée-Conti, “a mais exótica de todas as gemas da Borgonha”, outra célebre região vinífera francesa, como se lê no Guia ilustrado Zahar dos vinhos franceses, de Robert Joseph (Jorge Zahar, 288 páginas, R$ 59). Uma garrafa de um desses vinhos, caso proveniente de grandes safras, é cotada em milhares de dólares. Nos leilões, quanto mais antiga e rara é a garrafa, mais alto é o lance vencedor. Assim, a oferta de um premier cru de 200 anos como o Lafitte 1787 já seria o leilão do século.
No caso daquela garrafa em particular, havia um aperitivo histórico que tornava seu valor “inestimável”, nas palavras do leiloeiro da Christie’s, Michael Broadbent. Em 1985, ele afirmou que a garrafa fazia parte de um lote recém-descoberto que teria pertencido a Thomas Jefferson, o terceiro presidente dos Estados Unidos. Na década de 1780, quando era embaixador em Paris, tomou gosto pelo vinho. Por isso, Jefferson é considerado o primeiro enólogo americano. Quase dois séculos depois, sua adega teria sido achada durante uma reforma em Paris. Estava atrás de uma parede. Essas informações foram repassadas a Broadbent pelo descobridor da adega emparedada, Harry Rodenstock, um colecionador alemão acima de suspeitas. Para Rodenstock, as garrafas eram de Jefferson por causa das iniciais “Th.J.” gravadas no vidro.
Com o passar dos anos, outras garrafas do lote foram a leilão. Embora sua autenticidade nunca tenha sido comprovada, ela também não era questionada abertamente. Isso até o bilionário americano Bill Koch ter gastado meio milhão de dólares em quatro delas. Colecionador compulsivo, Koch possui quadros de Picasso, Degas e Renoir, além do rifle do general Custer, do revólver de Jesse James e de uma adega com 40 mil garrafas. Só existe uma coisa que ele aprecia mais que suas coleções: vingança. Quando Koch soube, em 2000, que as garrafas podiam ser falsas, contratou um agente aposentado do FBI para investigar Rodenstock. Desde 2005, Koch já torrou mais de US$ 1 milhão na investigação, o dobro do que perdeu com suas quatro garrafas. O livro é a história da investigação – e de um mundo de cifras milionárias, degustadores obsessivos e falsários de alta classe.
Publicado originalmente em ÉPOCA, em 09/01/2009.
O leiloeiro Michael Broadbent em 1974. Ele vendeu a garrafa de vinho mais cara da história |
O valor exorbitante se deve a uma conjugação de fatores. O Château Lafite (que hoje se escreve com um só tê) Rothschild é uma das glórias de Bordeaux, a mais célebre região vinífera da França. Seus companheiros dessa categoria de vinhos tintos sem rival, os premiers crus, são os Haut-Brion, Latour, Margot e Mouton-Rothschild. A eles se somam apenas outros dois tintos, o Pétrus, também de Bordeaux, e o Romanée-Conti, “a mais exótica de todas as gemas da Borgonha”, outra célebre região vinífera francesa, como se lê no Guia ilustrado Zahar dos vinhos franceses, de Robert Joseph (Jorge Zahar, 288 páginas, R$ 59). Uma garrafa de um desses vinhos, caso proveniente de grandes safras, é cotada em milhares de dólares. Nos leilões, quanto mais antiga e rara é a garrafa, mais alto é o lance vencedor. Assim, a oferta de um premier cru de 200 anos como o Lafitte 1787 já seria o leilão do século.
No caso daquela garrafa em particular, havia um aperitivo histórico que tornava seu valor “inestimável”, nas palavras do leiloeiro da Christie’s, Michael Broadbent. Em 1985, ele afirmou que a garrafa fazia parte de um lote recém-descoberto que teria pertencido a Thomas Jefferson, o terceiro presidente dos Estados Unidos. Na década de 1780, quando era embaixador em Paris, tomou gosto pelo vinho. Por isso, Jefferson é considerado o primeiro enólogo americano. Quase dois séculos depois, sua adega teria sido achada durante uma reforma em Paris. Estava atrás de uma parede. Essas informações foram repassadas a Broadbent pelo descobridor da adega emparedada, Harry Rodenstock, um colecionador alemão acima de suspeitas. Para Rodenstock, as garrafas eram de Jefferson por causa das iniciais “Th.J.” gravadas no vidro.
Com o passar dos anos, outras garrafas do lote foram a leilão. Embora sua autenticidade nunca tenha sido comprovada, ela também não era questionada abertamente. Isso até o bilionário americano Bill Koch ter gastado meio milhão de dólares em quatro delas. Colecionador compulsivo, Koch possui quadros de Picasso, Degas e Renoir, além do rifle do general Custer, do revólver de Jesse James e de uma adega com 40 mil garrafas. Só existe uma coisa que ele aprecia mais que suas coleções: vingança. Quando Koch soube, em 2000, que as garrafas podiam ser falsas, contratou um agente aposentado do FBI para investigar Rodenstock. Desde 2005, Koch já torrou mais de US$ 1 milhão na investigação, o dobro do que perdeu com suas quatro garrafas. O livro é a história da investigação – e de um mundo de cifras milionárias, degustadores obsessivos e falsários de alta classe.
Publicado originalmente em ÉPOCA, em 09/01/2009.
Comentários
Postar um comentário