Um crânio espetacular chama a atenção do mundo para um novo dinossauro brasileiro
Peter Moon
Um dinossauro pastava onde hoje é o norte de Minas Gerais quando foi soterrado por uma avalanche de lama. A lama asfixiou o bicho, preservando-o de forma extraordinária. Após 120 milhões de anos, seu crânio com 48 centímetros é uma das mais importantes descobertas da paleontologia brasileira. Para os paleontólogos, cientistas que passam a carreira vasculhando barrancos e cascalho em busca de fósseis, achar um crânio é o maior dos troféus, um golpe de sorte reservado a poucos. Alberto Carvalho, de 36 anos, do Museu de Zoologia da Universidade de São Paulo (USP), é um deles. Em 2007, dois anos depois de achar em Coração de Jesus, Minas Gerais, a costela de 1 metro de uma nova espécie de dinossauro, Carvalho obteve seu troféu. Achou um crânio completo da ponta do focinho à base da nuca. Ao todo, Carvalho coletou 18 ossos e 47 fragmentos de quatro animais, que estudou ao lado de Hussam Zaher, diretor do Museu de Zoologia. A espécie foi batizada de Tapuiasaurus macedoi, em homenagem à tribo tapuia que vivia na região.
O tapuiassauro pertence à família dos titanossauros, dinossauros quadrúpedes e pescoçudos que viviam no supercontinente Gondwana (formado pela união da América do Sul, África, Índia, Austrália e Antártica). O tapuiassauro é a nona espécie de titanossauro brasileira. Das 50 espécies conhecidas, quase todas foram descritas com base numa costela ou num par de vértebras. Não é o caso do tapuiassauro. Seu crânio é digno de exposição nos principais museus do mundo. Antes dele, só se conheciam dois crânios deformados e incompletos de titanossauro.
Esse é o tipo de descoberta que pode alavancar a carreira de um pesquisador, lançando-o da obscuridade aos holofotes da academia – o que rende propostas de emprego e acesso a preciosos recursos de pesquisas. O estudo foi enviado ao jornal PLoS One. Reza o rito acadêmico que um novo nome científico só pode ser divulgado após o estudo ser aceito para publicação. Enquanto a equipe aguardava o parecer da publicação, prosseguiam os preparativos para a abertura, em outubro, de uma exposição no museu. A estrela será a reconstituição do tapuiassauro.
Mas a descoberta foi anunciada na terça-feira, no jornal O Estado de S. Paulo. O anúncio veio antes da hora – o que pode deixar de render os dividendos acadêmicos que o estudo merece. O Estadão acompanhou a pesquisa com exclusividade, comprometendo-se a noticiar o dinossauro após a aceitação do estudo. Mas, no dia 10, o jornal soube que a história teria vazado para o Jornal Nacional. O Estadão pediu a Zaher para publicar a notícia. Obteve a autorização, desde que sem o nome Tapuiasaurus macedoi. O nome foi retirado do texto, mas uma menção escapou, e ele se tornou público. Para o leigo, pode parecer uma formalidade boba. Na academia, a transgressão é grave. Mesmo tratando-se de um fóssil fenomenal, paleontólogos estrangeiros afirmam que, caso o estudo tivesse sido submetido às revistas Science ou Nature, extremamente tradicionais, elas agora o recusariam.
Publicado originalmente em Época, em 16/09/2010.
Peter Moon
Um dinossauro pastava onde hoje é o norte de Minas Gerais quando foi soterrado por uma avalanche de lama. A lama asfixiou o bicho, preservando-o de forma extraordinária. Após 120 milhões de anos, seu crânio com 48 centímetros é uma das mais importantes descobertas da paleontologia brasileira. Para os paleontólogos, cientistas que passam a carreira vasculhando barrancos e cascalho em busca de fósseis, achar um crânio é o maior dos troféus, um golpe de sorte reservado a poucos. Alberto Carvalho, de 36 anos, do Museu de Zoologia da Universidade de São Paulo (USP), é um deles. Em 2007, dois anos depois de achar em Coração de Jesus, Minas Gerais, a costela de 1 metro de uma nova espécie de dinossauro, Carvalho obteve seu troféu. Achou um crânio completo da ponta do focinho à base da nuca. Ao todo, Carvalho coletou 18 ossos e 47 fragmentos de quatro animais, que estudou ao lado de Hussam Zaher, diretor do Museu de Zoologia. A espécie foi batizada de Tapuiasaurus macedoi, em homenagem à tribo tapuia que vivia na região.
O tapuiassauro (foto: Tiago Queiroz/AE) |
O tapuiassauro pertence à família dos titanossauros, dinossauros quadrúpedes e pescoçudos que viviam no supercontinente Gondwana (formado pela união da América do Sul, África, Índia, Austrália e Antártica). O tapuiassauro é a nona espécie de titanossauro brasileira. Das 50 espécies conhecidas, quase todas foram descritas com base numa costela ou num par de vértebras. Não é o caso do tapuiassauro. Seu crânio é digno de exposição nos principais museus do mundo. Antes dele, só se conheciam dois crânios deformados e incompletos de titanossauro.
Esse é o tipo de descoberta que pode alavancar a carreira de um pesquisador, lançando-o da obscuridade aos holofotes da academia – o que rende propostas de emprego e acesso a preciosos recursos de pesquisas. O estudo foi enviado ao jornal PLoS One. Reza o rito acadêmico que um novo nome científico só pode ser divulgado após o estudo ser aceito para publicação. Enquanto a equipe aguardava o parecer da publicação, prosseguiam os preparativos para a abertura, em outubro, de uma exposição no museu. A estrela será a reconstituição do tapuiassauro.
Mas a descoberta foi anunciada na terça-feira, no jornal O Estado de S. Paulo. O anúncio veio antes da hora – o que pode deixar de render os dividendos acadêmicos que o estudo merece. O Estadão acompanhou a pesquisa com exclusividade, comprometendo-se a noticiar o dinossauro após a aceitação do estudo. Mas, no dia 10, o jornal soube que a história teria vazado para o Jornal Nacional. O Estadão pediu a Zaher para publicar a notícia. Obteve a autorização, desde que sem o nome Tapuiasaurus macedoi. O nome foi retirado do texto, mas uma menção escapou, e ele se tornou público. Para o leigo, pode parecer uma formalidade boba. Na academia, a transgressão é grave. Mesmo tratando-se de um fóssil fenomenal, paleontólogos estrangeiros afirmam que, caso o estudo tivesse sido submetido às revistas Science ou Nature, extremamente tradicionais, elas agora o recusariam.
Publicado originalmente em Época, em 16/09/2010.
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