INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL - As máquinas vão ultrapassar a inteligência humana após 2020


Vernor Vinge, o profeta da inteligência artificial, alerta para os riscos e as oportunidades que a consciência eletrônica oferece à humanidade.

PETER MOON (2007)

Com a interligação de todos os computadores e celulares do planeta via internet, a capacidade dos processadores não pára de acelerar. Parece um complô muito bem orquestrado, onde computadores quânticos, nanotecnologia e biotecnologia colaboram para o advento da Superinteligência. A opinião é do matemático Vernor Vinge, de 66 anos, professor aposentado da Universidade da Califórnia em San Diego e autor de romances de ficção-científica. Em 1993, ele fez seu primeiro alerta para os riscos deste mundo que, Vinge acredita, virá. Ele aposta que as máquinas ultrapassarão o homem em algum momento após 2020. Veja por que nesta entrevista:

Peter Moon - Em 1997, o supercomputador Deep Blue venceu o campeão mundial de xadrez Garry Kasparov. Foi o vislumbre de uma nova forma de inteligência?

Vernon Vinge - Creio que Deep Blue tinha uma programação inovadora, mas o sucesso previsível aconteceu principalmente em função da tendência existente de melhoramento na performance do hardware dos computadores. O resultado foi uma performance melhor que a humana em um problema único de uma área limitada. No futuro, veremos melhoramentos no software e hardware que levarão este sucesso a outros domínios intelectuais.

PM - Em 1993, você proferiu na Nasa uma profética palestra sobre aproximidade da Singularidade Tecnológica. Poderia explicar o que a tal singularidade?

Vinge - Parece plausível supor que com a tecnologia nós poderemos, num futuro relativamente próximo, criar (ou nos tornar) criaturas que ultrapassem os humanos em todas as dimensões intelectuais e criativas. Quaisquer eventos que acontecerem além deste evento - o surgimento da inteligência artificial ou singularidade tecnológica – são inimagináveis para nós assim como uma ópera o é para uma lesma de jardim.

PM - Ainda acredita no advento da Singularidade?

Vinge - Acredito que seja a mais provável previsão não-catastrófica para as próximas décadas.

Moon - A explosão da internet e da computação móvel estão acelerando a chegada deste evento?

Vinge - Sim. Existem outros caminhos possíveis para a Singularidade, mas ao menos a equação computadores + comunicações + pessoas fornece uma base sólida para futuros saltos intelectuais.

Moon - Quando surgir máquinas inteligentes, que cara terão?

Vinge - Muito provavelmente elas serão menos visíveis do que os computadores são hoje. Em sua maiorias, elas irão operar via redes e processadores embutidos nas máquinas comuns do nosso dia-a-dia. Por outro lado, as manifestações do seu comportamento podem ser mudanças muito espetaculares no nosso mundo físico. Uma exceção serão os robôs móveis. Mesmo antes da Singularidade, eles provavelmente irão se tornar muito impressionantes, tornando-se mais ágeis e coordenados do que os atletas humanos, mesmo em situações ao ar livre.

Moon - Como saberemos que as máquinas terão consciência?

Vinge - A esperança e o perigo estão no fato de que estas criaturas serão como crianças. Como com qualquer criança, uma questão fundamental é assegurar sob qual moral elas irão se desenvolver. Neste sentido, existem boas razões para ter esperança, apesar, é claro, do perigo de que estas crianças em particular serão muito mais poderosas do que as nossas naturais.

Moon - O célebre astrofísico britânico Stephen Hawking declarou em 2001 à revista Focus que: “Com uma alteração do nosso patrimônio genético, podemos aumentar a complexidade do DNA e, por conseqüência, melhorar a homem (...) Devemos seguir este caminho, se queremos que os sistemas biológicos sobrevivam aos eletrônicos. Ao contrário do nosso intelecto, os computadores duplicam sua capacidade a cada 18 meses. Daí advém o perigo real de que desenvolvam inteligência e dominem o mundo. Nós temos também que desenvolver rapidamente técnicas para possibilitar uma ligação direta entre o cérebro e os computadores, permitindo que a inteligência artificial contribua para a inteligência humana e não se volte contra nós”. Você crê que esta modificação genética seja factível?

Vinge - Acredito que ela é tanto prática quando positiva – e sujeita às mesmas preocupações relacionados aos computadores. No longo prazo, não creio que a biologia orgânica possa acompanhar o passo do harware. Por outro lado, a biologia orgânica é robusta em modos diferentes das máquinas de hardware. A sobrevivência da vida será melhor servida através da preservação e aperfeiçoamento de ambas as estratégias.

Moon - A união da nanotecnologia com a engenharia genética e a informática poderá representar uma ameaça para a Humanidade, como Bill Joy, o ex-guru da Sun Microsystems, alertou, em 2000, no manifesto “Por que o futuro não precisa da gente”, publicado na revista Wired

Vinge - O planeta (e o universo) são repletos de ameaças mortais. A tecnologia é a fonte de algumas destas ameaças – mas ela igualmente nos tem protegido como outras. Eu acredito que a tecnologia é, ela própria, a melhor resposta da vida contra os riscos que nos ameaçam.

Moon - Neste momento, o Pentágono emprega mais de cinco mil robôs no Iraque, patrulhando cidades, desarmando explosivos ou realizando vôos de reconhecimento. O próximo passo é fazê-los andar armados. É o cenário de O exterminador do futuro?
Vinge - Isto é concebível, embora não seja uma razão para se dar as costas à robótica. A guerra mundial termonuclear, que saiu da moda, e algumas formas de guerra biológica são muito mais simples, mais prováveis, e provavelmente mais letais do que o cenário de O exterminador do futuro.

Moon - Em seu romance Rainbows End, a trama se passa em 2025, quando a Humanidade usa computadores vestíveis e está imersa na realidade virtual, cercada por sensores onipresentes. Este cenário é plausível?

Vinge - É o cenário (não-catastrófico) mais plausível para 2025 que se possa imaginar. 

Moon - E não é assustador, que você define com “a grande conspiração à liberdade”?

Vinge - Antes do computador pessoal, a maioria das pessoas acreditava que os computadores fossem o grande inimigo da liberdade. Quando surgiu o PC, muitas pessoas perceberam que milhões de computadores nas mãos dos cidadãos eram uma defesa contra a tirania. Agora, no novo milênio, vemos como os governos podem usar as redes para um monitoramento onipresente, e isto é assustador. Mas uma das idéias que procuro passar no meu livro é a possibilidade de que o abuso governamental se torne irrelevante.
Na medida em que a tecnologia ganha importância, os governos precisam fornecer a ilusão da liberdade para os milhões de pessoas que precisam se manter felizes e criativas para manter a economia nos trilhos. Tudo somado, estas pessoas possuem maior diversidade e recursos (e até mesmo melhor coordenação) do que qualquer governo. Os bancos de dados on-line, as redes de computadores e as redes sociais fornecem a esta tendência um enorme impulso. No final, a “ilusão da liberdade” pode ser mais real do que em qualquer outro momento da história. Com a internet, o povo pode atingir uma nova forma de populismo, potencializado por um conhecimento absolutamente profundo e abrangente.


Publicado originalmente no IDGNow!, em 27/04/2007

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